Documentários

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Ônibus das 6


6 horas da tarde, ela, mãe de família e mais de 20 almas, umas em pé, fritando seus miolos moles no sol escaldante de verão, outras cozinhando de dentro pra fora naquele ponto de ônibus que mais parecia um instrumento público de tortura. Como se deixar seu próprio filho em casa para trabalhar mais de 10 horas por dia cuidando do filho de outra mãe não fosse duro o bastante.
O ônibus demora a chegar, entre os pecadores estão, velhas e velhos, jovens e moribundos, trabalhadores, prostitutas, religiosos, crianças de colo, pedreiros, vagabundos e empregadas, mas dentro do transporte público, toda esta formalidade e rotulação desnecessária não tem a menor importância, são todos sardinhas de bolsos cheios.
Chega a lotação, e ele vem explodindo de gente, cheio de mais e mais almas zumbis encontradas em muitos outros fornos urbanos espalhados pela cidade. As pessoas caminham para dentro, em fila indiana, como um rebanho de vacas amestradas, prontas para o abate. Lá, ela já sabe o que a espera, é o mesmo destino de muitos ali, uma viajem longa e cansativa até em casa, se debatendo uns aos outros tentando se manter em pé e ao mesmo tempo se esquivando da angústia da espera. Logo mais a frente vê-se mais uma fornalha pronta para embarcar no expresso enlatado. Obviamente, aquilo estava lotado, mas não o bastante para a empresa, afinal, quanto mais e mais vacas entrarem, maior o churrasco do fim de semana.


Tato Leprexa

Um comentário:

  1. Ótimo texto!

    Já imagino essa narração como abertura de algum curta. Agradeço o Ricardo por ter indicado o site.

    See ya

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