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domingo, 15 de julho de 2012

depois do almoço




Aos que vierem depois de nós



Realmente, vivemos muito sombrios!
A inocência é loucura. Uma fronte sem rugas
denota insensibilidade. Aquele que ri
ainda não recebeu a terrível notícia
que está para chegar. 

Que tempos são estes, em que
é quase um delito
falar de coisas inocentes.
Pois implica silenciar tantos horrores!
Esse que cruza tranquilamente a rua
não poderá jamais ser encontrado
pelos amigos que precisam de ajuda?

É certo: ganho o meu pão ainda,
Mas acreditai-me: é pura casualidade.
Nada do que faço justifica
que eu possa comer até fartar-me.
Por enquanto as coisas me correm bem
(se a sorte me abandonar estou perdido).
E dizem-me: "Bebe, come! Alegra-te, pois tens o quê!"

Mas como posso comer e beber,
se ao faminto arrebato o que como,
se o copo de água falta ao sedento?
E todavia continuo comendo e bebendo.

Também gostaria de ser um sábio.
Os livros antigos nos falam da sabedoria:
é quedar-se afastado das lutas do mundo
e, sem temores,
deixar correr o breve tempo. Mas
evitar a violência,
retribuir o mal com o bem,
não satisfazer os desejos, antes esquecê-los
é o que chamam sabedoria.
E eu não posso fazê-lo. Realmente,
vivemos tempos sombrios.


Para as cidades vim em tempos de desordem,
quando reinava a fome.
Misturei-me aos homens em tempos turbulentos
e indignei-me com eles. 
Assim passou o tempo
que me foi concedido na terra. 

Comi o meu pão em meio às batalhas.
Deitei-me para dormir entre os assassinos.
Do amor me ocupei descuidadamente
e não tive paciência com a Natureza.
Assim passou o tempo
que me foi concedido na terra.

No meu tempo as ruas conduziam aos atoleiros.
A palavra traiu-me ante o verdugo.
Era muito pouco o que eu podia. Mas os governantes
Se sentiam, sem mim, mais seguros, — espero.
Assim passou o tempo
que me foi concedido na terra.

As forças eram escassas. E a meta
achava-se muito distante.
Pude divisá-la claramente,
ainda quando parecia, para mim, inatingível.
Assim passou o tempo
que me foi concedido na terra.

Vós, que surgireis da maré
em que perecemos,
lembrai-vos também,
quando falardes das nossas fraquezas,
lembrai-vos dos tempos sombrios
de que pudestes escapar.

Íamos, com efeito,
mudando mais freqüentemente de país
do que de sapatos,
através das lutas de classes,
desesperados,
quando havia só injustiça e nenhuma indignação.

E, contudo, sabemos
que também o ódio contra a baixeza
endurece a voz. Ah, os que quisemos
preparar terreno para a bondade
não pudemos ser bons.
Vós, porém, quando chegar o momento
em que o homem seja bom para o homem,
lembrai-vos de nós
com indulgência.



Bertolt Brecht (Tradução de Manuel Bandeira)

domingo, 8 de julho de 2012

vamos dropar





  "Tenho horror visceral a todas as religiões e espiritualidades, a todas as formas de estado, a todas as estabilizações, silenciamentos e opressões. E principalmente aos rebanhos e multidões em suas minúsculas lutas por sobrevivência. Mas antes disso fujo dos intelectuais de escola primária que não sabem disso, dos artistas tonitroantes e herdeiros da pátria, dos escritores herdeiros da língua e que mentem descaradamente que não passam de servos."
Parerga e Paralipomena, Schopenhauer

sexta-feira, 6 de julho de 2012




"As coisas não vão bem quando a humanidade fatiga excessivamente sua inteligência e procura ordenar com auxílio da razão as coisas inacessíveis à razão. Então surgem ideais, tais como os dos americanos ou dos bolchevistas; ambos são extraordinariamente racionais, mas desejando ingenuamente simplificar a vida acabam por violentá-la de maneira terrível. A igualdade do homem, um ato ideal das épocas pretéritas, está a ponto de se tornar um clichê. Talvez nós, os loucos, consigamos enobrecê-lo um pouco."


Hermann Hesse em O Lobo da Estepe